17 de fevereiro de 2011

UM POUCO DO BORING ARSENAL

Por Felipe Bigliazzi

Boring Arsenal Boring: Eis o termo que marcou aquela vitoriosa equipe comandada por Bertie Mee no principio da década de 70. Com mentalidade totalmente oposta a do time atual, o Arsenal obteve em 1971, a famosa dobradinha. Aquele time aguerrido, definido pelos rivais londrinos - de Chelsea, Tottenham e West Ham - como a equipe mais chata da Inglaterra -adorava vencer os seus embates pela mínima contagem.

Tinha como jogador emblemático, Charlie George; o volante carismático e raçudo, que acabaria entrando para a historia do clube ao marcar o gol do titulo da Copa da Inglaterra, daquele ano, frente ao Manchester United. Prata da casa, George bem que poderia servir como exemplo a ser seguido pelos jovens mimados de Arséne Wenger. Nenhum torcedor do Arsenal pode reclamar da proposta deliciosa do manda-chuva francês. O que incomoda é a falta de títulos, ou melhor dizendo, de grandes vitorias em jogos graúdos. Nesta noite no Emirates, mais do que a sobrevida na principal competição interclubes do mundo, os garotos de Wenger tinham a chance de provar que enfim, podem crescer. Pela frente, o adversário ideal; aquele com quem aprendera a filosofia de que a bola é a bíblia, e o gol, um mero detalhe.

O rival não era apenas o embrião futebolístico, mas também o algoz mais temido e admirado da década. Aquele gol espírita de Belletti, e a atuação hollywoodiana de Lionel Messi, no ano passado, ainda atormentam a cabeça de todos. De Barcelona também vem a peça fundamental de Arséne Wenger.É claro, estamos falando de Cesc Fabregas. O meia catalão, tirado das canteras blaugranas, começou a partida ao lado de Samir Nasri - que voltava de lesão - e do veloz Theo Walcott. Juntos formariam a linha de três armadores do esquema 4-2-3-1, armado por Wenger, com objetivo de pressionar o Barça na sua saída de bola. Nos primeiros 15 minutos, a proposta do Arsenal deu resultado. O Barcelona estava preso, paralisado em seu próprio campo. Mais do isso, o Barcelona estava sem a bola. Antes do jogo, Andrés Iniesta, havia dito que o Arsenal, assim como o conjunto culé, goza quando estão com a bola, e sofre quando estão sem ela. E foi isso que aconteceu. Van Persie teve a primeira chance, após belo passe de Fabregas; e as coisas pareciam florescer no norte de Londres.

Eis, porém, que de repente, o conjunto culé encaixou a marcação. Para conter o tic tic do Barcelona, Wenger escalou Wilshere e Song, como cães de guarda. Ambos deveriam seguir a dupla do momento: Xavi e Iniesta. No entanto, estamos falando da melhor equipe do mundo, e com um ataque rápido, habilidoso, e ainda por cima, imprevisível taticamente, o campeão espanhol começou a criar suas chances. A troca de posições entre Messi e Villa eram um tormento. Na primeira chance, Villa se transvestiu de Messi, e com um passe cirúrgico, deixou o argentino cara a cara para tirar o branco do placar. Com um toque sutil, a pulga tirou Wojciech Szczesny, mas com caprincho dos deuses londrinos, a bola passou rente ao poste, e assim, o melhor do mundo ficou outra vez sem sentir o gosto de gritar um gol na terra da rainha. Com seu 4-3-3, já clássico, o Barcelona começou a dominar as ações. Messi atuava sem posição fixa. Com Song e Wilshere, atormentados com o toque de bola de Xavi e Iniesta, o Arsenal ficava sem um marcador para Messi. Villa que a priori, se posicionava pelo lado esquerdo do ataque, saia em velocidade, confundindo Eboué e toda defesa do Arsenal. E foi justamente assim, que surgiu o passe genial de Messi, para que o artilheiro da Espanha no último mundial, desse um toque sutil: 1 a 0 e silencio no Emirates.

No intervalo, certamente, aqueles barrigudos, semi-calvos, com a sabedoria de um gunner cinquentão, ponderava que para evitar o mesmo final da temporada passada, era preciso ser o velho Boring Arsenal. Não há como vencer o Barcelona jogando apenas com a bola nos pés, o negócio era apelar para o ímpeto de outrora. No banco de reservas, havia certa inspiração. Pat Rice, então lateral direito daquela equipe de 71, estava ali, sentando ao lado de Wenger, como assistente técnico e símbolo da gana que deveria ser imposta.

No segundo tempo, com o afã semelhante aos dos tempos de Rice, o Arsenal retomou o domínio das ações; no entanto, o fator chave para o enredo final, acabaria vindo com as modificações orquestradas por ambos treinadores. Guardiola, que havia sido estagiário de Wenger, recuou o time, apostando em Keita, para tentar conter os avanços de Walcott - que começara a atormentar o frágil Maxwell. No entanto, Guardiola matou o que tinha de melhor até então. Sacando Villa, conseqüentemente, acabaria apagando Messi, já que Pedro estava totalmente fora de ação e aquela alucinante troca de posições no ataque culé estava decretada ao acaso.

Wenger, astutamente, colocou Arshavin pela meia-esquerda. Nasri, inverteu de lado e assim, começaria o pesadelo culé. Para aguçar a pressão, o treinador francês ainda colocaria Bendtner, e assim, o Arsenal terminaria a partida, em um agressivo 4-1-3-2. A audaz mudança seria recompensada.O empate veio em um passe sagaz de Arshavin, que encontrou Van Persie; o holandês, que vive grande fase, ganhou a posição, e bateu aparentemente sem ângulo, mas contando com a falha de Valdés, anotou o empate para delírio da metade vermelha do norte de Londres. Assim, como no passado, o empate deixava o torcedor com sabor a nada. Era preciso vencer.

Eis que, como num capitulo épico de Febre de Bola, Fabregas armou um contra-ataque digno do Boring Arsenal. Nasri dominou, olhou, e assim, encontrou Arshavin vindo na corrida.Entrando em diagonal, o russo rolou com categoria, de primeira, no contra pé de Victor Valdés. Era a redenção. A confiança estava de volta e o orgulho de voltar ao passado e afirmar: para voltar a ganhar dos grandes é preciso um pouco da alma do Boring Arsenal

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